A filosofia cristã nasce sob a fórmula encontrada no Profeta Isaías, “Nisi credideritis non intelelligetis” (Se não crerdes, não compreendereis). Tirada da tradução dos Setenta, hoje sabemos que ela está incorreta. De toda forma, Agostinho não se cansa de retomá-la em suas obras. Neste artigo, observaremos que o seu encontro com Cristo e com a fé cristã exerceu uma mudança sobre a sua avaliação da filosofia e do exercício da razão. Verificaremos que ele distinguia dois usos da razão: uma que precede a fé e consiste no exame e discernimento do que se deve crer; outra que a sucede e consiste na tentativa de inteligir os mistérios da fé até onde isso for possível neste mundo. Teremos o ensejo de perceber que foi a partir deste segundo uso da razão, que busca o entendimento da fé já assentida, que nasceu o filosofar na fé, em Agostinho. Ele opõe este filosofar na fé à filosofia dos gentios, que era alheia à fé, e concebe a conquista do intellectus fidei como uma recompensa à fé, que começa por crer no que ainda não vê. Observaremos, ademais, que, na concepção de Agostinho, razão e fé são complementares; mais do que isso, como adiante comentaremos com mais clareza, o próprio ato de fé não é senão um ato da inteligência que assente. Observaremos, no entanto, que persiste nas obras do Bispo de Hipona, certa indeterminação entre teologia e filosofia, chegando mesmo a haver, em certos momentos, por razões que também aduziremos no decorrer do texto, uma identificação da filosofia com a teologia e com a própria religião cristã. |