Após conhecermos que algo é, resta-nos saber como ele é – o seu “quomodo” – para, afinal, sabermos o que ele é (quid sit). No caso de Deus, porém, já que não temos como conhecer o seu “quomodo”, não há, por conseguinte, como sabermos o que Ele é (quid sit). Destarte, aqui, teremos que proceder de forma diferente. E o modo como procederemos é o seguinte: conquanto não possamos conhecer o como Deus é (quomodo sit) ao conhecermos as suas criaturas, podemos, ao menos, averiguar o como Ele não é (quomodo non sit). Daí estarmos em condições de verificar, pelo menos, o que Ele não é (quid non sit). Isto se dará do seguinte modo. Afastaremos dEle tudo o que for indigno e incompatível à sua natureza. Desta feita, poderemos chegar a determinar, ainda que tão somente de forma negativa, o que seja a natureza divina.
Sem embargo, nesta empreitada, a primeira coisa que Tomás descarta da natureza de Deus, é toda e qualquer forma de composição. De fato, a simplicidade é o primeiro atributo de Deus a ser arrolado pelo Aquinate. De resto, é o mais importante a ser estabelecido. Com efeito, a constatação da simplicidade divina não é senão uma dedução procedente das próprias cinco vias da existência de Deus. Tal dedução consiste em afastar dAquele cujo ser é simplesmente e unicamente ser (esse), toda forma de não-ser, ou seja, tudo aquilo que o pudesse limitar no seu ser (suum esse), afetando, desta feita, a sua unicidade. Portanto, no fim do estudo da natureza divina, reencontrar-nos-emos com o mesmo Ato Puro de Existir que as das cinco vias nos atestaram: “Que se pode esperar achar ao término da análise que se anuncia, senão o ser puro de tudo aquilo que não seja o ser?”
Com efeito, o estudo da natureza divina em Tomás é um corolário espontâneo das provas da existência de Deus. Sendo assim, será a constatação da simplicidade divina o pressuposto de todos os demais atributos divinos, pois será ela que nos irá explicitar o que já estava antes implícito na própria demonstração da existência do Ato Puro de Existir. Deste modo, o estudo dos atributos divinos será como que um prolongamento das provas da existência de Deus e seu desenvolvimento natural, esclarecendo-nos o que é condizente ou não com a natureza deste Ato Puro de Existir. De sorte que a questão da simplicidade divina é o fundamento de qualquer estudo dos atributos divinos.
No presente texto, tentaremos fazer o mesmo caminho que Tomás percorreu para chegar à simplicidade divina. Antes de tudo, apresentando as razões, excluiremos a possibilidade de Deus ser um corpo. Em seguida, eliminaremos a possibilidade de que a substância divina seja composta de matéria e forma. Após isso, passaremos a afirmar a identidade, em Deus, entre essência e substância. Continuando, esmeraremos por tornar claro que em Deus existe uma identidade entre essência e ser (esse), que o torna um Ato Puro de Existir. Nisto consiste a simplicidade divina: a identidade entre substância, essência e ser. Concluiremos contemplando alguns corolários inferidos a partir da absoluta simplicidade do Ipsum Esse Subsistens.